FLOR

As Jornadas de Junho e as Câmaras de Eco


Em junho de 2013, o Brasil se viu no meio de uma batalha entre população e governo. Aquela falta de ordem, que normalmente precede uma grande revolução, no caso deste país, foi de ideologia. A primeira década do século 21 trouxe muita gente para o mundo da informática e da internet, a chamada "inclusão digital". Juntando-se com o boom de acesso aos smartphones, acabou coincidindo com o tempo das revoltas, impulsionando-as para além do que a mídia tradicional era capaz de informar.


    Meia década depois, tudo parece ter ruído. Se "polarização" é a palavra da vez, ela mostra-se em todos os âmbitos sociais. Desde a tradicional briga política até uma discussão acalorada e desproporcional sobre desenhos animados. O que será que aconteceu com o Brasil e o mundo? Alguns pensadores falam que a internet ajuda a catalizar o ódio, ou por conta de comentários escondidos atrás do anonimato, ou pela distância entre os agentes da discussão, que dariam liberdade para dizer qualquer coisa que vem à cabeça. Mas, talvez, algo maior esteja acontecendo.

    Quando se fecha uma bolha social, em que pessoas com pensamentos semelhantes permanecem guardando suas ideias em um grupo sem diversidade, e uma opinião é lançada nela, esta ecoa através de pessoas concordando e a alimentando cada vez mais. Esta bola de neve é chamada de "Câmara de Eco Positiva", fazendo uma analogia às câmaras acústicas que retransmitem a voz para todos os lados, inclusive para o emissor que a recebe satisfeito. A internet, principalmente nas redes sociais, ajudou a criar mais câmaras como esta.

    Até quem não quis se fechar  em uma bolha acabou dentro de algumas inconscientemente. Um tweet feito em cima de um trending topic, item da listagem dos assuntos mais falados no Twitter, já se encaixa em outros que confirmam aquilo que foi dito, com pouquíssimas opiniões contrárias. O fenômeno das câmaras de eco não é de exclusividade do ódio. Quem nunca viu alguma postagem na internet do tipo "este foi o melhor almoço da minha vida" ou "eu nunca ri tanto na minha vida toda"? Tudo é mais intenso no mundo virtual.

    Isto não começou agora. Mesmo antes da grande rede existir, comunidades já tinham bloqueios ideológicos e a auto-confirmação de opiniões acontecia ali naquele grupo de amigos, naquela escola, naquele bairro, até em uma cidade inteira. Um fenômeno destes é adubo para a criação de lendas, atrasos intelectuais e, o pior de tudo, preconceitos. Se mil pessoas estão acostumadas com uma "verdade", por mais errada que ela esteja, uma exposição da verdadeira realidade vira ofensa. A retaliação é certa e desmedida. 

    O maior exemplo do passado é a própria Segunda Guerra Mundial. Durante séculos foram plantadas sementes na cabeça de populações inteiras, pricipalmente o antissemitismo. Quando alguém percebeu a arma que tinha em mãos, aproveitou-se do preconceito já criado para ecoar absurdos que validaram e reforçaram atitudes inaceitáveis. Algo tão abstrato resultou nas duas maiores catástrofes da história da humanidade: o holocausto e as bombas atômicas no Japão.

    Se as Jornadas de Junho trouxeram mais interesse pela política, suas consequências trouxeram à tona pensamentos ultrapassados que estavam adormecidos, preconceitos travestidos de opinião, de pessoas que se aproveitaram das câmaras de eco para espalhar o que há de pior em si. Além disso, ao invés de navegar na internet e se aproveitar do oceano de conhecimento que ela proporciona, a maioria está apenas boiando em um mar denso, tamanha a sujeira trazida por fóruns e redes sociais. A maior ferramenta criada pelo animal pensante para difundir pensamentos é mais do que subtutilizada, tem seu uso invertido. Pouco se cria, pouco se transforma, pouco se entende, a não ser o que não deve ser criado, transformado ou entendido.

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