FLOR

CRIANDO RÓTULOS, LIMITANDO A PRÓPRIA EXISTÊNCIA

Independentemente da crença, ou da falta dela, é inquestionável a evolução do homem como ser e como ente da sociedade. Evolução esta que criou indivíduos muito distintos entre si, peculiares, com a própria visão do mundo.


Isso quer dizer que Paulo pensa diferente de Pedro, mas Paulo, peça importante em sua comunidade, depende de Pedro, outro fragmento indispensável. Vai além, Paulo ama Pedro, são grandes amigos. A dependência entre um e outro é mais que objetiva, é emocional, a ponto de um não ter a menor ideia de como seria a vida se o outro partisse dessa para uma melhor.
Contudo, o desenvolvimento da sociedade como há hoje trouxe um problema, o homem-catalogador. O humano médio gosta de catalogar, de padronizar tudo que puder na tentativa de tornar mais fácil ou mais automatizada a sua vida. Já é da espécie, genético, não há como evitar isso. Com meses de vida, vemos a nossa mãe falando e queremos repetir. Primeiro ligamos nomes a pessoas ou objetos, a mãe aponta para o marido e diz “papai”, até o bebê entender que aquele homem deve ser chamado assim. Depois, a criança tenta repetir a palavra, usa sua boca, suas vias respiratórias, emite sons, imita silabas, até entender como é o processo para falar tal verbete. Quando aprende, registra em seu cérebro que é assim que tem de ser feito, cria o padrão para isso tudo.
As grandes descobertas devem ter sido assim também, como o fogo, as lentes, a medicina, a navegação. Daí para o homem evoluir e entender que os padrões criam atalhos para as tarefas foi rápido. Tudo em nossa vida é aprender, criar estes padrões e replicá-los. Isso, mais uma vez, colocou a espécie humana dentro de uma bolha, a de conhecimento, limitando a forma como interagimos com o mundo e com as outras pessoas. Você olha para o seu irmão e o ama, afinal, é seu irmão, sangue do seu sangue, foi assim que essa relação foi padronizada e não é você que vai quebrar essa corrente.
E na adolescência, é tudo lindo, não? As tribos se unem, os semelhantes ficam juntos para enfatizar a sua semelhança. Mais padrões, quem gosta do que eu gosto é esperto, quem não gosta não sabe o que está perdendo. Nessa fase, os limões até se juntam com outros cítricos, mas ai da banana que quiser sentar ao lado no recreio.
Aí, o menino-catalogador vira o homem-catalogador que bota tudo e todos em caixinhas com rótulos: o melhor-amigo, o chefe, o ideal, o rumo da vida, a marca ruim, a cidade boa. Com objetos, tudo bem, são criados por nós com a limitação que nós os impomos. A gente, por outro lado, é subjetiva. Não tem como dizer que este é melhor do que aquele simplesmente por olhar para critérios rasos, sem ver o contexto em que está inserido, sua história de vida.
Pouco antes de escrever este texto, vi duas vezes, em redes sociais, postagens como “cansei de gente assim...”. Pera lá, amigo, vai com calma. Não coloque pessoas em potinhos e depois as descarte em massa por ter um ponto em comum, são muito mais úteis que em um fim de semana. Têm muito mais amor que um terceiro ano do ensino médio. O homem não é um móvel com uma utilidade limitada ao seu gosto em determinado período, é uma casa inteira repleta de cômodos com grande gama de finalidades e que abrigou famílias por inúmeras gerações.
Não dá para medir um amor com um punhado de casos específicos, muito menos amar todas as pessoas da mesma forma. E tem coisa pior, tem maluco por aí querendo que todo mundo seja igual a um amado padrão ou até a si próprio. Uma coisa que aprendi é que você não viveria com uma cópia de você mesmo, é irritante. Faça o teste, pegue-se em um momento qualquer e veja se é tão divertido te acompanhar. É muito melhor compartilhar momentos com alguém que enxergue coisas que você não vê. Aliás, se eu quisesse alguém para replicar tudo que eu fizesse, compraria um gravador.

Antes de cansar de um nicho, dá para ver se não tem como aproveita-lo de outra maneira. Paulo não tem só a Pedro, tem Joana, tem José, tem Cleópatra, sua gata de estimação. Paulo tem um leque de direções que pode tomar e não, necessariamente, precisa escolher apenas uma. Paulo é inteligente demais para pensar apenas como Paulo, ou apenas como Pedro.

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