FLOR

SOMOS MAIS QUE ANTROCENTRISTAS

                Eu pensei, tempos atrás, em escrever um texto sobre como o ser humano superou o tóxico teocentrismo e tornou a sociedade o mais antropocentrista possível. Também, nesse texto, escreveria sobre como, já na Revolução Francesa, o homem conseguiu intoxicar esse ideal de forma tão ou mais prejudicial que no período anterior. O problema é que o homem é ainda pior que isso e foi Rick and Morty que me abriu os olhos.

 

              Antes de tudo, devo dizer que precisei abrir dois latões de cerveja antes de escrever sobre essa série. É tudo tão bem construído e amarrado nesse sitcom, ao mesmo tempo que o próprio universo da série caminha em direção inversa a ser algo estável, completo. O próprio Rick está em um patamar de entendimento tão complexo sobre a inconsistência da vida humana que não conseguiria permanecer sobreo durante muito tempo vendo o que vê.
                Mas se uma série consegue, finalmente, diminuir a raça humana a um grão de areia no universo, o que disso teria a ver com o antropocentrismo? Bom, tudo começou quando, nas cenas pós-créditos do sexto episódio da terceira temporada de Rick and Morty, a Adult Swim resolveu colocar a seguinte frase como se fosse uma homenagem póstuma: “Ao roteiro de Game of Thrones [2011-2016]”.


                Resumindo essa novela, a Adult Swim resolveu colocar por conta própria a frase, o que deixou o co-criador Dan Harmon desgostoso com todo rebuliço que a situação causou. Harmon chegou a culpar um estagiário da emissora na tentativa de denegrir o autor da brincadeira. A questão é: como pode o autor de Rick and Morty, uma das séries mais politicamente incorretas da história, ficar incomodado com uma piada sobre uma série apenas por ser fã da tal, como ele mesmo diz em seu perfil no Instagram?
                Daí que reitero que o homem evoluiu do antropocentrismo para o egocentrismo quase de imediato. Ou pior, nem mesmo toda reviravolta social pós Idade Média conseguiu segurar a onda por muito tempo. O homem não poderia ser capaz de criar algo bom delegando a Deus toda culpa, aí delegou-se. E, delegando-se, conseguiu esconder quase todas suas qualidades e expor seus defeitos, fez todo novo mundo girar em torno deles. O cenário piorou.
                É difícil enxergar além do próprio nariz se a pessoa acha que o seu próprio nariz é maravilhoso. Fazer críticas aos defeitos que identifica nos gostos do outro é tão legal, mas vai alguém criticar os seus gostos para fazer brotar a revolta no coraçãozinho cheio de fúria, ou a ironia como no caso de Dan Harmon.
                O homem luta pela ideologia, porém, antes de qualquer coisa, luta por suas ideias dentro de determinada ideologia. Espera-se que o mundo se adapte a cada realidade, o que é impossível a considerar a vasta gama de gente diferente que existe. Surge, como resultado, uma briga de egos vislumbrando convencer uma massa a seguir ideais limitados em busca de autoafirmação.


                É muito bom lavar os pés antes de colocar os sapatos.

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